quarta-feira, 6 de junho de 2012

Portugal Outlook




Numa época cuja interdependência entre os diversos actores internacionais se afirma como um factor essencial para a compreensão da dinâmica político-económica global, atentar sobre qual a ideia de Portugal no estrangeiro e o que sobre nós se pensa é um exercício de grande relevância. Assim, este artigo apresenta-se como um modesto contributo nesse sentido, projectando uma breve análise sobre a imagem do Governo português no estrangeiro.

As eleições

Os resultados das eleições legislativas portuguesas do dia 5 de Junho de 2011 foram vistos pela imprensa internacional como factor integrante de um fenómeno à escala da União Europeia: a derrota, nas respetivas eleições, dos governos que se viram a braços com uma crise financeira sem precedentes desde os acordos de Bretton Woods.

A capa da edição nacional do El País (jornal espanhol) fez manchete com a alteração política em Portugal – “A crise arrasa com os socialistas portugueses nas eleições”. Entre os jornais alemães, o Spiegel escreveu que “os portugueses castigam o Governo de Sócrates e entregaram o poder aos conservadores do PSD” e o Frankfurter Allgemeine destacou a derrota de Sócrates. Nos jornais francófonos, o Le Monde não atribuiu grande importância aos resultados das eleições portuguesas, ao passo que o Libération sublinhou a subida ao poder de Passos Coelho. Já no Reino Unido, o Financial Times escreveu que “a vitória social-democrata abre caminho para o resgate externo no valor de 78 mil milhões de euros”, enquanto o The Guardian destacou que Passos Coelho obteve uma grande vitória eleitoral, em sintonia com um movimento de mudança que abrange toda a Europa. Finalmente, em Itália, o Corriere della Sera afirmou que “como previsto, o eleitorado português puniu o PS”.

Primeiros passos do executivo

Poucos meses após a entrada em funções do governo passista, Obama já clamava numa conferência na Casa Branca que “ao contrário do que as pessoas andam a dizer, nós não somos a Grécia nem Portugal”. Acrescentando ainda que “ao contrário da Grécia ou Portugal, nós temos a possibilidade de estabilizar as finanças da América por uma década ou 15 e 20 anos, se quisermos agarrar este momento”. Decididamente, estas não foram palavras de estímulo ao Governo português que então iniciava funções.

A somar ao cenário negativo que as perspectivas sobre Portugal carregavam, veio juntar-se o escândalo das contas públicas da Região Autónoma da Madeira, que fez manchete de artigos em vários jornais internacionais e notícia na maioria dos telejornais europeus.

Passados poucos meses de governação passista, surgiam as primeiras avaliações ao trabalho do executivo. Escrevia, então, o El País sobre Portugal que “o governo… eliminará os subsídios aos funcionários [públicos] que ganhem mais de 1.000 euros por mês, medida que também abrange os pensionistas.” O Le Monde destacava, por sua vez, a nova série de medidas austeras que iriam ser implementadas em Portugal, em convergência analítica com o que o Le Fígaro chamava de “Orçamento de rigor para 2012″. As descidas de rating de que Portugal foi alvo por parte das agências norte-americanas, que já vinham do governo anterior, enegreceu o quadro que a imprensa internacional traçava sobre Portugal . No El País, podia-se ler que “a agência Moody’s baixa a divida de Portugal ao nível lixo”. O Tema não passou despercebido em Inglaterra, designadamente através do The Times.

2012 – a continuação

Já em Janeiro do presente ano, o acordo laboral alcançado através da concertação social, assinado pelo governo, pelo patronato e pela UGT, foi bem visto pelos líderes e pela imprensa internacionais. A chanceler alemã, Angela Merkel, louvou publicamente o sucesso desta concertação social, integrando-a nos sucessos alcançados na Europa para uma política sustentável. Infelizmente, este acordo laboral parece estar em cheque, uma vez que a UGT reclama a falta de cumprimento do governo para com o acordado relativamente ao crescimento económico. E também isso faz eco lá fora…

Dois meses mais tarde, Portugal volta à ribalta mediática devido à Greve Geral de 22 de Março, a segunda desde o resgate financeiro protagonizado pela Troika. O The Wall Street Journal citou as declarações do secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos – “o país chegou ao máximo de austeridade que pode aguentar!” Ao passo que o jornal francófonoLibération, intitulou um artigo sobre a greve geral de “Um Portugal em greve quer dizer basta à austeridade.”

Mas a maioria dos líderes europeus, principalmente os que se identificam com a linha política do actual Governo, tem vindo a lançar elogios sobre o actual executivo. Veja-se o exemplo do agora ex-presidente francês, Nicolas Sarkozy, numa entrevista ao Expresso – “Estou muito optimista com Portugal. Portugal está em avanço, tal como a França, quanto aos seus objectivos em matéria de redução do défice”.

Do Portugal em palavras ao Portugal real

Esta retórica optimista que também Angela Merkel, Durão Barroso, entre outros, têm tido em relação ao governo português, procurando encorajá-lo num mandato difícil, não tem tido eco na imprensa internacional, nem nas agências de rating. Refira-se o exemplo da Associated Press, que recentemente realizou uma reportagem sobre Portugal. Nesta é traçado o retrato de um país com cada vez mais casos de famílias a declararem falência. Antigamente poucas famílias portuguesas declaravam falência, em contraste com o que hoje acontece, onde o número de insolvências pessoais (mais de 670 mil portugueses) já é superior ao das empresas.

Publicado no jornal online "Letra1", em 05/06/2012

Sem comentários: