sábado, 28 de abril de 2012

Miguel Portas

   Nascido no dia 1 de Maio, data simbólica para o ideário progressista, Miguel Portas, um dos fundadores do Bloco de Esquerda e o primeiro eurodepudato eleito por este partido, morreu aos 53 anos de idade, no dia 24 de Abril, às portas da 38ª celebração da revolução dos cravos.
   Deixa à sociedade portuguesa um legado de tolerância, de inteligência e de ideais progressistas, sendo amplamente reconhecida a sua capacidade para dialogar, sem nunca se refugiar em sectarismos políticos ou ideológicos.
   Como cidadão, deixo aqui a minha homenagem a um homem que é hoje uma referência para todos os portugueses. Pessoalmente, procurarei seguir o seu exemplo como homem de franca esquerda que não se refutou ao diálogo e à procura de consensos com outras formas de pensar.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

25 de Abril Sempre!


 
   Faz hoje 38 anos que a revolução dos cravos pôs fim à ditadura e ao Estado Novo. Interessa, nesta data, ler com muita atenção o comunicado dos capitães de Abril, sem os quais a implementação da democracia não teria sido possível, independentemente de concordarmos, ou não, com a totalidade  do seu conteúdo.


Abril não desarma
Há 38 anos, os Militares de Abril pegaram em armas para libertar o Povo da ditadura e da
opressão e criar condições para a superação da crise que então se vivia.
Fizeram-no na convicta certeza de que assumiam o papel que os Portugueses esperavam
de si.
Cumpridos os compromissos assumidos e finda a sua intervenção directa nos assuntos
políticos da nação, a esmagadora maioria integrou-se na Associação 25 de Abril, dela
fazendo depositária primeira do seu espírito libertador.
Hoje, não abdicando da nossa condição de cidadãos livres, conscientes das obrigações
patrióticas que a nossa condição de Militares de Abril nos impõe, sentimos o dever de tomar
uma posição cívica e política no quadro da Constituição da República Portuguesa, face à
actual crise nacional.
A nossa ética e a moral que muito prezamos, assim no-lo impõem!
Fazemo-lo como cidadãos de corpo inteiro, integrados na associação cívica e cultural que
fundámos e que, felizmente, seguiu o seu caminho de integração plena na sociedade
portuguesa.
Porque consideramos que:
O contrato social estabelecido na Constituição da República Portuguesa foi rompido
pelo poder. As medidas e sacrifícios impostos aos cidadãos portugueses
ultrapassaram os limites do suportável. Condições inaceitáveis de segurança e bem-estar social atingem a dignidade da pessoa humana.
O rumo político seguido protege os privilégios, agrava a pobreza e a exclusão social,
desvaloriza o trabalho.
Sem uma justiça capaz, com dirigentes políticos para quem a ética é palavra vã,
Portugal é já o país da União Europeia com maiores desigualdades sociais.
Portugal não tem sido respeitado entre iguais, na construção institucional comum, a
União Europeia.
Portugal é tratado com arrogância por poderes externos, o que os nossos
governantes aceitam sem protesto e com a auto-satisfação dos subservientes.
O nosso estatuto real é hoje o de um “protectorado”, com dirigentes sem capacidade
autónoma de decisão nos nossos destinos.
Entendemos ser oportuno tomar uma posição clara contra a iniquidade, o medo e o
conformismo que se estão a instalar na nossa sociedade e proclamar bem alto, perante os
Portugueses, que: -  A linha política seguida pelo actual poder político deixou de reflectir o regime
democrático herdeiro do 25 de Abril configurado na  Constituição da República
Portuguesa;
- O poder político que actualmente governa Portugal, configura um outro ciclo político
que está contra o 25 de Abril, os seus ideais e os seus valores;
Em conformidade, a A25A anuncia que:
- Não participará nos actos oficiais nacionais evocativos do 38.º aniversário do 25 de
Abril;
- Participará nas Comemorações Populares e outros actos locais de celebração do 25
de Abril;
- Continuará a evocar e a comemorar o 25 de Abril numa perspectiva de festa pela
acção libertadora e numa perspectiva de luta pela realização dos seus ideais, tendo
em consideração a autonomia de decisão e escolha dos cidadãos, nas suas
múltiplas expressões.
Porque continuamos a acreditar na democracia, porque continuamos a considerar que os
problemas da democracia se resolvem com mais democracia, esclarecemos que a nossa
atitude não visa as Instituições de soberania democráticas, não pretendendo confundi-las
com os que são seus titulares e exercem o poder.
Também por isso, a Associação 25 de Abril e, especificamente, os Militares de Abril,
proclamam que, hoje como ontem, não pretendem assumir qualquer protagonismo político,
que só cabe ao Povo português na sua diversidade e múltiplas formas de expressão.
Nesse mesmo sentido, declaramos ter plena consciência da importância da instituição
militar, como recurso derradeiro nas encruzilhadas decisivas da História do nosso Portugal.
Por isso, declaramos a nossa confiança em que a mesma saberá manter-se firme, em
defesa do seu País e do seu Povo. Por isso, aqui manifestamos também o nosso respeito
pela instituição militar e o nosso empenhamento pela sua dignificação e prestígio público da
sua missão patriótica.
Neste momento difícil para Portugal, queremos, pois:
1. Reafirmar a nossa convicção quanto à vitória futura, mesmo que sofrida, dos valores de
Abril no quadro de uma alternativa política, económica, social e cultural que corresponda
aos anseios profundos do Povo português e à consolidação e perenidade da Pátria
portuguesa.
2. Apelar ao Povo português e a todas as suas expressões organizadas para que se
mobilizem e ajam, em unidade patriótica, para salvar Portugal, a liberdade, a
democracia.
Viva Portugal!
Lisboa, 23 de Abril de 2012

terça-feira, 24 de abril de 2012

Voz inconfundível do fadista Alfredo Marceneiro, letra magistral do poeta Carlos Conde



Ser pequenino


Que bom que é ser pequenino,

Ter pai, ter mãe, ter avós,

Ter esp’rança no destino

E ter quem goste de nós.


A velhice trás revés,

Mas depois da meninice

Há quem adore a velhice

P’ra ser menino outra vez.

Ser menino, que altivez

De optimismo e desatino!

Ver tudo bom e divino,

Tudo esperança, tudo fé,

Enquanto a vida assim é

Que bom que é ser pequenino!...


Ver tudo com alegria,

Sem delongas, sem demora,

Ver a vida numa hora

Ter na mente a fantasia

Dum bem que ninguém supôs,

Ter crença, sonhar a sós,

Co’ a grandeza deste mundo

E, para bem mais profundo,

Ter pai, ter mãe, ter avós.


Ter muito enlevo a sonhar,

Acordar e ter carinho,

Ter este mundo inteirinho

No brilho do nosso olhar.

Viver alheio ao penar

Deste orbe torpe, ferino,

Julgar-se eterno menino,

Supor-se eterna criança,

E, num destino sem esp’rança,

Ter esp’rança no destino.


Ó desventura, ó saudade,

Causas da minha inconstância,

Daí - e pedaços de infância,

Retalhos de mocidade.

Dai-me a doce claridade

Roubando-me ao tempo atroz

Quero ter a minha voz

P’ra cantar o meu passado...

É tão bom cantar o fado

E ter quem goste de nós!...

terça-feira, 17 de abril de 2012

Jean-Luc Mélenchon, um sinal de unidade à esquerda

    À esquerda de François Hollande, candidato do Partido Socialista francês, Jean-Luc Mélenchon tem sido, através do seu carisma, a grande revelação da campanha eleitoral para as presidenciais francesas. Tribuno por excelência, lidera um movimento chamado "Frente de Esquerda", que reúne socialistas dissidentes, comunistas, entre outras correntes de esquerda. Tem defendido uma revolução cidadã que acabe com o rumo ultra liberal da UE, propondo o fim do Tratado de Lisboa e do Pacto que fixa aos Estados da UE objectivos de equilíbrio orçamental. Afirma que, para acabar com a crise das dívidas soberanas e estimular o crescimento, é necessário criar um "Fundo de desenvolvimento social, ecológico e solidário", permitindo repartir os financiamentos com taxas de juro muito baixas entre os países da Zona Euro.
    Defende, também, o controlo democrático a que o BCE deve estar sujeito, para que este empreste dinheiro com juros baixos directamente aos Estados, ao contrário do que acontece actualmente, onde o BCE empresta aos Bancos e estes, por sua vez, emprestam aos Estados, alcançado, por isso, lucros exorbitantes. Relativamente à crise das dívidas soberanas, defende, como qualquer economista credível, a renegociação para os países em dificuldades: "A negociação deve incluir um reescalonamento dos reembolsos, a baixa das taxas de juro e a anulação parcial da dívida dos Estados. Só assim salvaremos a Europa."
    Ao contrário do que está em voga na Europa dominada pela direita, Jean-Luc Mélenchon preza por uma integração mais harmoniosa dos imigrantes, visando uma Europa universalista e não nacionalista. Desta forma, com um discurso forte e coerente, este candidato está cotado com 15% das intenções de voto, o que é extremamente positivo se considerarmos que no início da campanha contava apenas com 5%.
    Seria bom que os partidos socialistas europeus repensassem as suas acções, uma vez que se deixaram embarcar pelo projecto ultra liberal que a direita tem vindo a implantar na Europa. Em Portugal, com António José Seguro como Secretário Geral do PS, esse caminho não perece estar a ser feito, uma vez que este está disposto a assinar o tratado orçamental promovido pelo Alemanha, pautado pela mais pura ortodoxia liberal. 

domingo, 15 de abril de 2012

Verbum Die (XI)

"A vida já é curta, mas nós tornamo-la ainda mais curta, desperdiçando tempo."

Victor Hugo

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Sentada


Numa planície verdejante atravessada por um pequeno rio límpido, descansa uma mulher sentada num imenso colchão de erva, olhando para a água a correr e a vida a passar. Leva a mão à cabeça e estende os seus cabelos para trás ao mesmo tempo que deita o olhar sobre o céu. Nele, vê as nuvens a passarem com a vida. Volta a pousar o olhar no rio, olha para a água cristalina e absorve-a o mais que pode. Tenta absorver toda a sua pureza, quer fazer parte da genuinidade daquilo que os seus olhos azuis vêem. Quer se sentir no outro lado de lá da natureza.
Levantando-se calmamente, ao ritmo de uma vagarosa brisa de ar fresco, aproxima-se do rio e ajoelha-se para o tocar e sentir. Pousando delicadamente as mãos na face para se refrescar, fica a olhar o seu reflexo que vai ficando cada vez mais nítido. Observa-se através do espelho da natureza, admira a sua beleza e juventude, admira os seus olhos, a sua boca, o seu nariz, os seus cabelos dourados, admira todos os seus traços faciais.
Um momento de vaidade que lhe trouxe ao pensamento a história de Narciso. Embora soubesse nadar, sabia muito bem a moral daquela história ancestral, levantando por isso a cabeça e lançando o olhar sobre a verde planície coberta de árvores que se erguiam dispersamente. Percebeu que fazia parte de um mundo, que era parte integrante de tudo aquilo que a rodeava. Era como uma daquelas árvores…
Senta-se com os pés a repousarem no rio, observa o seu movimento contínuo e ouve os seus sussurros. Pensa se aquilo que sente naquele momento será o mesmo que sentirá quando a juventude a tiver abandonado, levando consigo a vaidade. Dá por si, mais uma vez, a antecipar o futuro através de construções do passado. Então, percebe que é isso que a impossibilita de ser uma árvore. Afinal, estamos do lado de cá porque contamos o tempo. 

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Paga o justo pelo pecador

Um aposentado grego de 77 anos suicidou-se na Praça Syntagma , a Praça da Constituição, em frente ao parlamento, perante o desespero causado pela calamidade em que a Grécia vive. Para todos os cidadãos do mundo, deixou uma pequena carta que aqui transcrevo: 

"O Governo de Tsolakoglou aniquilou qualquer possibilidade de sobrevivência para mim, que tinha como base uma pensão muito digna que paguei, por minha conta, sem qualquer ajuda do Estado, durante 35 anos. E dado que a minha idade avançada não me permite reagir de forma diferente (mas se um compatriota grego pegasse numa Kalashnikov, eu apoiá-lo-ia) não vejo outra solução a não ser acabar com a minha vida deste modo digno, para não ter que terminar rebuscando nos contentores do lixo, para poder sobreviver. Creio que os jovens sem futuro vão um dia ter que pegar em armas e pendurar de cabeça para baixo os traidores deste país na Praça Syntagma , como os italianos fizeram com Mussolini em 1945. "
           
 Dá muito que pensar, não dá?
             Entretanto, o ministro das finanças alemão, Wolfgang Schäuble, veio dizer que as críticas que a imprensa grega tem dirigido à Alemanha são "normais" nos países que viveram acima das suas possibilidades e que, depois, pretendem culpar os outros.
Resta concluir que há algo de profundamente errado entre o discurso deste senhor e o desespero que reina na Grécia. Que terá feito aquele senhor, e os gregos em geral, para merecerem tal destino? Nada! Simplesmente, a economia ultra liberalizada faz com que "o justo pague pelo pecador". A pergunta que fica no ar é - Até quando? 

sábado, 7 de abril de 2012

Verbum Die (X)

Conquista

Livre não sou, que nem a própria vida
Mo consente.
Mas a minha aguerrida
Teimosia
É quebrar dia a dia
Um grilhão da corrente.

Livre não sou, mas quero a liberdade.
Trago-a dentro de mim como um destino.
E vão lá desdizer o sonho do menino
Que se afogou e flutua
Entre nenúfares de serenidade
Depois de ter a lua!

Miguel Torga, in 'Cântico do Homem'

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Fernando José Salgueiro Maia



Fez ontem, dia 4 de Abril, vinte anos que o Capitão Salgueiro Maia morreu, aos 47 anos de idade. 
Foi um Homem fundamental para o sucesso da revolução de Abril. Por sua livre consciência, manteve-se afastado dos órgãos de poder, apesar de várias vezes ter sido solicitado para ocupar cargos importantes. 
Aqui ficam as memoráveis palavras de Salgueiro Maia dirigidas "às suas tropas", durante a madrugada do dia 25 de Abril de 74, na Escola Prática de Cavalaria em Santarém: "Meus senhores, como todos sabem, há diversas modalidades de Estado. Os estados sociais, os corporativos e o estado a que chegámos. Ora, nesta noite solene, vamos acabar com o estado a que chegámos! De maneira que, quem quiser vir comigo, vamos para Lisboa e acabamos com isto. Quem for voluntário, sai e forma. Quem não quiser sair, fica aqui!"
  

quarta-feira, 4 de abril de 2012

O negócio do Cruddas


Peter Cruddas, tesoureiro do Partido Conservador britânico, foi obrigado a demitir-se depois da divulgação de um vídeo em que “vendia” o acesso a David Cameron. Disfarçados de potenciais “compradores”, uns jornalistas filmaram secretamente a conversa que tiveram com este senhor, onde ficaram a saber que um simples jantar com o primeiro ministro custava 250 mil libras, ou seja, perto de 300 mil euros.
Um autêntico escândalo para o partido conservador! Qualquer pessoa, no seu juízo perfeito, sentirá uma profunda indignação perante tanta corrupção e hipocrisia nas estruturas de poder. E, provavelmente, este caso é sintomático relativamente ao que se passa na grande maioria das democracias. Obviamente, o problema não está na democracia, que é, ou deve ser, uma conquista definitiva do Ocidente. O problema está na sobreposição do sector financeiro sobre a política, está no incumprimento dos governantes da defesa do interesse público e está na corrupção que, quando em grande escala, normalmente, precede à impunidade.
"O que aconteceu foi completamente inaceitável. Não é esta a forma como angariamos dinheiro no Partido Conservador. Não devia ter acontecido". Eis as palavras de David Cameron perante o escândalo. Em vez de dizer que nada disto devia ter acontecido, o primeiro-ministro britânico devia dizer que se sentia envergonhado e, se realmente não aprovasse estes esquemas, admitir a sua falta de capacidade de liderança, uma vez que não consegue evitar a promiscuidade entre a sua governança e determinados interesses particulares.
Não é só em Portugal que os políticos do arco governativo carecem de sentido de Estado, em muitos outros países se passa o mesmo, desde a Itália até ao Reino Unido. A culpa não é do “português”, ou do “grego”. A culpa é dos vendilhões do templo!

domingo, 1 de abril de 2012

Verbum Die (IX)

"O mais terrível dos sentimentos é o sentimento de ter a esperança perdida"
Federico García Lorca