quarta-feira, 20 de junho de 2012

De indefinição em indefinição




A Nova Democracia, encabeçada por Antonis Samaras, venceu as eleições legislativas gregas do Domingo passado, permitindo que muita gente respirasse fundo, nomeadamente aqueles que se revêem na actual política europeia. O que é facto é que o Presidente grego Karolos Papoulias deverá por esta altura estar a conversar com Samaras e a inteirar-se das dificuldades relativas à formação de um novo governo. Se, por um lado, a Nova Democracia precisa de se coligar com o Pasok, uma vez que não obteve a maioria absoluta – mesmo com o “bónus” de 50 deputados que o sistema eleitoral grego prevê para o partido vencedor – por outro lado, o Pasok, terceiro classificado nas eleições, afirma que apenas fará parte do novo executivo se o Syriza, segundo partido mais votado, também o integrar. Ora, como seria de esperar, o Syriza recusa-se a integrar um governo com os dois partidos responsáveis pelo “estado de coisas” na Grécia.

Alexis Tsipras, líder do Syriza, apesar de não ter conseguido vencer as eleições, alcançou um resultado extraordinário: 27% face aos 17% da primeira volta das eleições. Este jovem político de 38 anos, enfrentou a chantagem de vários líderes europeus, nomeadamente da Senhora Merkel, sem nunca se desviar dos seus princípios e mantendo sempre uma coerência nos seus discursos e ideias, características raras nesta classe política dos tempos que correm.

Relativamente aos comunistas ortodoxos do KKE, liderados por Aleka Papariga, os resultados foram muito negativos, tendo descido de 8,5% na primeira volta para 4,5% na segunda. Provavelmente, a causa para esta descida reside na recusa deste partido em se coligar com o Syriza, revelando uma rigidez inqualificável. Quanto aos neonazis da Aurora Dourada, os resultados mantiveram-se relativamente inalterados.

Perante tudo isto, confrontamo-nos com a continuação da indefinição grega. Os partidos que defendem o memorando obtiveram apenas 41% dos votos, o que significa que este continua a ter um fraco apoio do povo grego, cansado de um programa que merece a crítica da grande maioria dos economistas. Face a esta constatação, Samaras prometeu renegociar os termos do memorando, o que deixou a Alemanha de olho franzido, tendo já um porta-voz do governo germânico deixado claro que a “solidariedade” alemã tem limites.

Vemos na Europa uma onda crescente de intelectuais, artistas, estudantes, entre outros, oporem-se com maior veemência ao modelo da austeridade. Veja-se o que aconteceu ontem em frança, onde os socialistas obtiveram uma vitória estrondosa através de um discurso contrário ao que se tem feito até esta data na Europa. E a razão para isto é muito simples: a austeridade adoptada como antídoto para os problemas europeus assemelha-se ao método salazarista/fascista, onde a promoção da necessidade de viver pobre mas honrado choca com a luxúria crescente de um punhado de gente que constrói e financia esta promoção. No tempo do Salazar eram os grandes industriais como a família Mello, hoje são os banqueiros que vêem os seus prejuízos e disparates serem pagos pelos cidadãos dos países em que operam. Se desconfia daquilo que escrevo perca algum tempo a analisar o que aconteceu em Espanha, que passou de uma divida pública considerada aceitável para uma situação de insustentabilidade, devido à “nacionalização” dos prejuízos dos seus bancos.

Pessoalmente, creio que todos devemos aplicar alguma austeridade às nossas contas, por forma a pouparmos e não estarmos exageradamente dependentes de financiamento externo. Mas uma coisa é falarmos desta austeridade de tipo protestante, outra é falarmos da austeridade em que vivemos no sul da Europa, que apenas promove miséria. Veja-se o que aconteceu há menos de cem anos atrás na Alemanha, o berço do protestantismo, onde as condições que lhe foram impostas pelas potências vencedoras após a primeira grande guerra, levaram a República de Weimar a adoptar um conjunto de medidas a que chamava de “austeras” para recuperar as contas públicas. Resultado: ascensão do nazismo! E se acha que a história não se repete, perca algum do seu tempo a estudar a emergência do nacionalismo na Europa actual…

Publicado no jornal online "Letra1", em 18/06/2012

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