segunda-feira, 21 de maio de 2012

Grécia – Do passado corrompido, ao futuro incerto

      Com o intuito de entrar na moeda única, os governantes gregos contaram com a preciosa ajuda da Goldman Sachs para disfarçar as contas públicas, recorrendo à engenharia financeira, nomeadamente através do investimento em produtos tóxicos, os quais viriam a estar no cerne da origem da crise financeira de 2008. Passados quatro anos, o berço da democracia e de muitas crenças e culturas, vive num contexto de catástrofe face ao descrédito a que os partidos do arco governativo estão sujeitos. Os governos do Pasok e da Nova Democracia desenvolveram um clientelismo endémico, com contornos mais graves dos que caracterizam o arco governativo português, atingindo níveis de corrupção extremos.
      A resposta do povo grego perante a constatação da “podridão” que envolvia aqueles que os governaram desde a queda do regime dos coronéis, em 1974, deu-se, essencialmente, a dois níveis: o primeiro caracteriza-se pela sucessão de assembleias populares de democracia directa, por formas organizadas de desobediência civil, por experiências de autogestão, entre outras acções colectivas; o segundo por uma mudança radical do sentido de voto. Nas últimas eleições, o Syriza, uma coligação que reúne um conjunto de partidos de esquerda radical, obteve um resultado extraordinário, chegando a ser o segundo partido mais votado, atrás da Nova Democracia e à frente do Pasok. Por outro lado, a Aurora Dourada, partido que se autoproclama neonazi, também obteve um resultado que não era expectável, embora as últimas sondagens apontem para uma diminuição dos seus eleitores. Apesar do que separa o Syriza da Aurora Dourada ser um oceano, e do facto de aqueles que os metem no mesmo saco revelarem uma profunda ignorância ou, simplesmente, um profundo facciosismo, não se pode descurar a notória ascensão de partidos que outrora não teriam qualquer hipótese de disputar o poder.
      No próximo mês de Junho haverá novas eleições na Grécia, para as quais a coligação do Syriza poderá tornar-se a força mais votada. Alexis Tsipras, cabeça de lista desta coligação, é um político jovem, conhecido pela sua inteligência e pragmatismo. Caso venha a constituir governo, possivelmente um governo de salvação nacional, Alexis Tsipras terá um desafio monumental pela frente. Este desafio pode ser dividido em três partes essenciais: a primeira será auditar a dívida grega, um processo que exige grande rigor e isenção; a segunda será renegociá-la, algo que já tem vindo a ser feito mas que precisa de uma abordagem mais realista para que seja um processo controlado e acordado pelas partes interessadas; e a terceira será a substituição do memorando da Troika, uma vez que está mais do que visto que este falhou redondamente o alcance dos seus objectivos.

Publicado no jornal online "Letra1", em 20/05/2012

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